28 abril 2025

José Carneiro (1911-1996): um homem de contas certas e sérias... Foi mordomo da festa da N. Sra. do Socorro em 1960 e teve de pagar do seu bolso 961 escudos e 63 centavos do "prejuízo" (cerca de 5,8 contos, a dividir por seis)...



Marco de Canaveses > Paredes de Viadores > Capela de N. Sra. do Socorro > 
25 de julho de 2015 > Esta capela remonta ao séc. XIX, estando erigida num dos pontos altos do território da freguesia...


Marco de Canaveses > Paredes de Viadores > Capela de N. Sra. do Socorro > 25 de julho de 2015 > Interior, com os andores, prontos para a procissão de domingo, dia 26...

Fotos (e legendas): © Luís Graça (2025). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné)


1.  Há festa na aldeia... No sábado para domingo, ao darem as 24 badaladas, rebenta o monumental fogo de artifício que é, de há muito, um dos momentos altos desta festa popular... São quase 30 minutos de fogo... Ninguém sabe quanto custa ( a preços de hoje, talvez 20 a  30 mil euros)... Todo o povo contribui generosamente para este e outros encargos da festa de N. Sra. do Socorro, a sant padroeira.

Terras antiquíssimas estas, com forte tradições de que são guardiãs e continuadoras as nobre e valentes gentes entaladasbentre o Rio Tâmega e o Rio Douro.

Estas festas fazem parte dos "nossos seres, saberes e lazeres" e são acarinhadas pelo pessoal da Tabanca de Candoz... Nunca é de mais lembrar, por outro lado, que o extenso concelho do Marco de Canaveses pagou um pesado imposto em sangue, suor e lágrimas durante a guerra colonial, tendo 45 dos seus filhos lá morrido, em terras de Angola, Guiné e Moçambique.  

A população do concelho era na altura de 39,3 mil (em 1960) e 42,1 mil (em 1970), Sabendo nós que a população portuguesa em 1970 era de 8,59 milhões, e tendo sido mobilizados 570 mil militares metropolitanos (70% de 800 mil no total, incluindo a tropa do recrutamento local), o número de jovens marcoenses que foram parar ao ultramar (Angola, Guiné e Moçambique) terá sido da ordem dos 2800.

Em chegando o verão, há foguetes e alegria no ar. Há festa, há a festa anual da padroeira de Paredes de Viadores, da freguesia do mesmo nome (mas agora mais comprido, já que a Paredes de Viadores juntou-se também a antiga freguesia de Manhuncelos). 

Por estas terras também andou o lendário herói do "banditismo social", Zé do Telhado ( Castelões de Recesinhos, Penafiel, 1818 / Mucari, Malanje, Angola, 1875). e o seu bando, cujas façanhas ficaram na memória das gentes dos vales do Sousa e Tâmega (onde nasceu Portugal). Desterrado, Zé do Telhado morreu em Angola (onde a sua memória ainda é, ao que parece, venerada).

Por aqui, Marco de Canaveses e Baião, passa também a rota do românico... que os portugueses de hoje deviam fazer pelo menos uma vez na vida!...

Por curiosidade, qual o orçamento desta festa ? Não tenho dados recentes, mas encontrei na Quinta de Candoz um apontamento de há 65 anos atrás. Trata-se da folha,  manuscrita,  com a escrituração das despesas e receitas, feita por José Carneiro (1911-1996), mordomo da festa, proprietário da Quinta de Candoz.

 Segundo a filha,  Ana Ferreira Carneiro Pinto Soares, "Nita" (1947-2023), era referente  à festa do ano de 1960, em que ela própria também participou,  então com os seus 13 anos. (#).



Lista 1 - Despesa  / Valor (em escudos | em euros, a  preços de 1960)

  • Fogo de quatro fogueteiros > 7600$00 | 3941 €
  • Música (sic) dos B. V. Portuenses > 4100$00 | 2126 €
  • Iluminação > 2750$00 |  1426 €
  • Música (sic) dos B. V. de Rio Mau  [Penafiel] > 2500$00 | 1297 €
  • Carne para os músicos [ das bandas] > 1222$00 | 634 €
  • Vinho para os músicos  > 1000$00 | 519 €
  • Armação [dos andores] > 1000$00 | 519 €
  • Mercearias > 763$60 | 396 €
  • Zés Pereiras > 450$00  | 233 €
  • Padres  450$00 | 233 €
  • Guarda [Nacional] Republicana > 360$00 | 187 €
  • Tipografia: programas e estampas > 290$00 | 150 €
  • Autofalante > 250$00 | 130 €
  • Carpinteiro do sr. Geraldes [do Juncal] > 162$00 | 84 €
  • Câmara  [Municipal]: Energia e eletricista > 137$50 | 71 €
  • 4 quilos de cavacas para os anjinhos > 100$00 | 52 €
  • Pão de trigo e de milho > 96$00 | 50 €
  • Licença da Câmara para as músicas > 66$00 | 34 €
  • Flores e correio > 58$80 | 30 €
  • João de Magalhães [que deitou o fogo] > 50$00 | 26 €
  • Gratificação para o electricista > 50$00 | 26 €
  • Carro em que regressou a GNR [ao posto, que era na vila]  > 40$00 | 21 €
  • Expediente > 28$80 | 15 €
  • Selo de 35 programas > 14$40 | 7 €
  • Despacho do fio de cobre para iluminação > 9$70 | 5 €
Total = 23447$6 | 12160

Lista nº 1 - Discriminação das despesas, por ordem decrescente,  da Festa de Nossa Senhora do Socorro (1960), Paredes de Viadores, Marco de Canaveses.   


Lista 2 - Receita   / Valor (em escudos | em euros, a  preços de 1960)


  • Recebeu-se dos mordomos de Paredes > 5791$60 | 3004  €
  • Recebeu-se dos mordomos de Viadores > 5186$50 | 2690 €
  • Rendeu a festa em dinheiro > 4240$20 | 2199 €
  • Apurou-se em ouro  [oferecido à santa]  > 1817$50 | 943 €
  • Renderam as flores [de papel] > 642$00 | 333 €

Total =17677$80 | 9168 €

Lista nº 2 - Discriminação das receitas, por ordem decrescente,  da Festa de Nossa Senhora do Socorro (1960), Paredes de Viadores, Marco de Canaveses.   

O prejuízo da festa (c. 5,8 contos)  foi dividido pelos 6 mordomos  que constituíam a comissão organizadora, tendo cabido  961$63, a cada um, ou seja, 499 € a preços de 1960…  Outros tempos, outras gentes, outros valores!...


 O famoso "santo Antoninho" dos anos 60...   A nota de "20 paus" (cópia)...(Segundo o Museu de Lisboa , a nota de 20$00 com a imagem de Santo António foi emitida pela primeira vez a 16 de janeiro de 1965.  Com a data de 26 de maio de 1964, no total foram emitidos  299,1 milhões de  notas. A 30 de maio de 1986 estás notas foram retiradas de circulação.)







Como termo de comparação, registe-se que nessa época  (1960) um jornaleiro ganhava, em média, 20 escudos (10 euros) por dia, enquanto um oficial (como o José Carneiro, ramadeiro, construtor de ramadas) cobrava 50 escudos (25 euros) pelo seu trabalho diário.(##)

A "Nita" lembrava-se, tinha ela 13 anos já feitos, de andar na festa a angariar dinheiro com as florinhas de papel que eram espetadas, com um alfinete, na lapela do casaco dos homens, à entrada do recinto. As receitas que daí provieram ainda atingiram uma cifra razoável para a época: 642$00 (333 €)... (###)

Também era vulgar as  pessoas ofereceram à santa padroeira da freguesia, a  Nª Srª do Socorro,  objetos em ouro (brincos, cordões, anéis, fios, etc.), como forma de pagamento de promessas.

Repare-se, por outro lado, que o foguetório já nessa altura representava 1/3 do total das despesas, e mais de outro tanto a contratação de duas bandas de músicas (uma do Porto e outra local, Rio Mau, Penafiel, concelho vizinho), pagas em dinheiro e em géneros (38%).  As duas bandas tocavam à compita.

Nas despesas com os padres (450 escudos), inclui-se o pregador, que vinha de fora.

Quanto às receitas, note-se que mais de 60% do total era constituído pelos peditórios, casa a casa, feitos por 2 grupos de mordomos, os de Paredes e os de Viadores, representando as duas metades do território da freguesia.

Também como termo de comparação, refira-se que,  hoje em dia, o compasso pascal da freguesia gasta facilmente em 10 ou 20 minutos de fogo de  artifício 10, 20 a 30 mil euros...É uma estimativa, grosseira, de quem está por dentro do assunto.

José Carneiro foi mais de uma vez mordomo destas festas de Nº Srª do Socorro, que se realiza todos os anos no último domingo de julho.
_________________

Notas do autor:

(#) Blogue A Nossa Quinta de Candoz > 30 agosto 2012 > José Carneiro (1911-1996). mordomo da festa da Nossa Senhora do Socorro em 1960

(##) Vd. logue A Nossa Quinta de Candoz > 29 agosto 2012 >  José Carneiro (1911-1996), construtor civil de ramadas

(###) Utilizámos o simulador de inflação da Pordata para fazer a conversão de escudos em euros (à data de 1960).

21 abril 2025

Os nossos "versinhos" ao compasso pascal...



O compasso pascal em Candoz, s/d (c. 1980). 
A Nita (1947-2023)  vinha à frente, do lado direito. 
Foto: LG



Madalena, Vila Nova de Gaia, 5 de abril de 2015.

A "Nita",  Ana Ferreira Carneiro Pinto Soares (1947-2023) 
faz as honras à casa....



... e lê os "versinhos ao compasso da Madalena"... É duro ver que,  neste vídeo de há 10 anos, há 3 dos nossos entes queridos que já não estão entre nós...

Vídeos: L.G. (2015). Alojados em You Tube > Luís Graça


 
1. Uma seleção dos meus versos dedicados ao "compasso pascal": há 50 anos que venho ao Norte, nesta data, ao Porto, à Madalena (V. N. Gaia), a Candoz (Paredes de Viadores, Marco de Canaveses). Nesta e noutras datas festivas, como o Natal, o Carnaval, etc., ou trabalhos coletivos da quinta, como a vindima... 

De há 20 anos a esta parte, deu-me para escrever um versos ou umas prosas poéticas por ocasião do Natal e da Páscoa... São versos singelos, ao gosto popular, para serem lidos na ocasião (neste caso, aquando da visita pascal).  

Na pandemia de Covid-19, a família falhou a vinda ao Norte pela Páscoa por razões óbvias: daí não ter havido nem versos nem compasso em 2020 e 2021...

Em 2023 morreu a nossa querida "Nita" (1947-2023), e a partir daí não mais abrimos a casa de Candoz ao compasso... É um sinal de luto na cultura das gentes de Entre Douro e Minho. Daí também não haver versos em 2024 e 2025... 

Em Paredes de Viadores, devido â dispersão geográfica das habitações os, a visita pascal (compasso)  reparte-se por dois dias: domingo de Páscoa, no dia seguinte,  segundas. Em Candoz, é sempre à segunda...

Hoje o pároco já não preside, como antigamente, à visita pascal. Essa função é agora exercida por um leigo, que transporta a cruz, sendo acompanhado por outros membros da comunidade paroquial. Geralmente, um dos mais novos, vem munido de um sineta cujo toque faz anunciar a chegada do compasso. 

O compasso é isso mesmo: a visita, ao redor da freguesia, em cortejo, a todas as casas das famílias cristãs, que sinalizam com urzes e pétalas de flores, o caminho que leva à casa, nas zonas rurais, ou com colchas (brancas) o andar da família que quer receber o compasso, nas vilas e cidades.

Em termos religiosos e sociais, a função principal do compasso é: (i) anunciar a ressurreição de Cristo; (ii) partilhar a alegria da Páscoa entre família, amigos e outros convidados; e (iii) benzer a casa e os presentes (que em geral representam duas ou mais gerações).

O cortejo vai andando de casa em casa. O mordomo que transporta o crucifixo, entrega-o em geral  ao "homem (ou mulher) da casa" que faz uma ronda, dando a beijar  a imagem de Cristo... (por razões de higiene pública, depois da pandemia, o beijo tende a tornar-se simulado).

Depois de uma breve oração, segue-se a oferta de alguns doces e bebidas ao compasso e aos demais presentes. No Norte, as famílias fazem também ofertas em dinheiro (que reverte para o padre e para o foguetório). Os do compasso têm se de polidos, comedidos e frugais: se bebessem em todas as casas, estavam "feitos"!... (mas antigamente era assim: o compasso recolhia à igreja, já bêbado que  nem um cacho!).

À saída do compasso, a caminho da próxima casa, é frequente deitar-se um ou mais foguetes, pagos pelo dono da casa que acabou de ser visitada.  No final do dia, "juntam-se as cruzes" (no caso das freguesias grandes) e, em muitas partes, há fogo de artifício (em geral muito vistoso, aqui no Marco de Canaveses e em Baião).

 Parte do dinheiro recolhido é para gastar em fogo. Por razões de segurança, o uso de  fogo de artifício tradicional (com foguetes de cana), não estando proibido,  está sujeito a uma estrita  regulamentação.

Resta-me fazer aqui uma recolha dos versos que publiquei no blogue da família, "A Nossa Quinta de Candoz". Aqui vão, com votos, para todos os  nossos amigos e camaradas da Guiné, de uma feliz e santa Páscoa de 2025. LG

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Viva o compasso pascal
Desta linda freguesia,
Fizeram-nos muito mal
Estes dois anos de pandemia.


Faltam beijos e abraços,
Mas lá iremos ao normal,
Hoje damos mais uns passos,
Viva o compasso pascal!

É uma antiga tradição
Que nos enche de alegria,
E reforça a união
Desta linda freguesia.

Andámos todos com medo
E com máscara facial,
Duas Páscoas sem folguedo
Fizeram-nos muito mal.

Sem compasso nem foguetório,
Sem convívio nem folia,
Nem sequer houve peditório
Nestes dois anos de pandemia. 

 (...) Quinta de Candoz, 18 de abril de 2022
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Mais um ano, mais uma visita
Deste compasso pascal,
É uma festa bem bonita,
E que nunca é igual.

E que nunca é igual,
Logo vem outro, se falta algum,
Renova-se o pessoal,
Que aqui somos todos por um.

Que aqui somos todos por um,
Na alegria ou na tristeza,
Na fartura ou no jejum,
Cabendo todos à mesa.

Cabendo todos à mesa,
Onde não falta o anho assado,
Nesta casa portuguesa,
Onde honramos o passado.

Onde honramos o passado,
O presente e o futuro,
Se alguém está adoentado,
Tem aqui um porto seguro.

Tem aqui um porto seguro,
Damos valor à amizade,
Às vezes o rosto é duro,
Mas o resto é humildade.

Mas o resto é humildade,
Viva o compasso pascal,
E a nossa fraternidade!...
Boa Páscoa, pessoal!

Boa Páscoa, pessoal,
Boa saúde e longa vida,
À Ti Nitas, em especial,
Que nos é muito querida!

Quinta de Candoz,
segunda feira de Páscoa,

22 de abril de 2019


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Já lá vem, em festa, p’la estrada fora,
O compasso pascal da freguesia,
Chega à nossa casa mesmo na hora,
E a todos saúda com alegria.

Mais do que a tradição, 
é a certeza
De que a Páscoa é também renascimento,
E há sempre mais um lugar à mesa,
Para nosso geral contentamento.

Se não for preenchido, é o dos ausentes,
E, em especial, dos nossos mortos queridos;
Aos que vieram e estão aqui presentes,

Saibam que nós ficamos muito honrados.
E, aos do compasso, diremos, reconhecidos:
Tenham um dia feliz, mesmo… estoirados!


Quinta de Candoz, 2 de abril de 2018

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Aleluia, Cristo ressuscitou!,
Apregoa o compasso pascal,
Que hoje nesta casa nos visitou,
E a todos nos juntou neste local.

É uma das ruas da Madalena,
Que tem nome do nosso primeiro rei,
E eu, quando não posso vir, tenho pena,
Porque a Páscoa é aqui, isso eu sei.

Lá vai o compasso pela rua fora,
Sem freima, com prazer e devoção,
Com ordem, em festiva procissão.

À frente vai a cruz e uma senhora,
E outra porta se abre, ali na hora…
Até p’ró ano… e viva a tradição!

Madalena, V. N. Gaia,
domingo de Páscoa,

16 de abril de 2017

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Olha o compasso pascal,
Visitando a freguesia,
Nesta casa, é bom sinal,
Traz-nos a fé e a alegria.

Traz-nos a fé e a alegria,
Que todos bem precisamos,
É a Santa Páscoa o dia
Em que as forças renovamos.

Em que as forças renovamos,
Como seres humanos e cristãos,
Boas festas desejamos,
Pais, filhos, amigos, irmãos.


Pais, filhos, amigos, irmãos,
Vizinhos da Madalena,
Mais os de longe que aqui estão,
E quem não veio vai ter pena.

E quem não veio vai ter pena,
De neste ano faltar,
Mas fez esta cantilena,
Para com vós partilhar.

Para com vós partilhar
As coisas boas do Norte,
E a amizade reforçar
Com um abraço bem forte.


Lisboa e Madalena, V. N. Gaia, domingo de Páscoa,
27 de março de 2016, 10h30
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Vem em abril este ano
O nosso pascal compasso,
Vem o sicrano e o beltrano,
A todos damos um abraço.

É já forte a tradição,
Desta gente aqui do Norte,
Abre a porta, pede a bênção,
A todos deseja sorte.

É um povo hospitaleiro,
Que sabe receber e dar,
Se na fé é o primeiro,
Não fica atrás no folgar.

Obrigados, nossos vizinhos,
Pela visita pascal,
E aceitem com carinhos
… As amêndoas deste casal.

(...) Madalena, 5 de abril de 2015
 
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Páscoa em março, fome ou mortaço,
Diz o povo… Mas em Candoz,
Não há Páscoa sem compasso,
E não há gente como… nós!

Viva o compasso pascal
Que nos vem visitar,
Franqueando nosso portal,
Santas bênçãos nos quer dar.

Páscoa é festa com mensagem:
Triunfa a vida sobre a morte;
Segue o compasso a viagem
E a todos deseja…sorte.

Viva o compasso pascal
Que nos faz esta visita,
Vem por bem, não vem por mal,
Mas traz um saco prá… guita!

Sem guita não há foguetes,
Que é coisa que o povo adora,
Sem ovos não há omeletes,
Sem folar não me vou… embora!

Páscoa é festa da nossa vida,
É tradição cá do Norte,
Não há gente tão querida,
Alegre e de altivo… porte.

É casa de boa gente,
É povo abençoado,
Que gosta de dar ao dente
E se pela por anho… assado!

Parabéns às cozinheiras
Desta bíblica iguaria,
Elas são também obreiras
Desta nossa… alegria.

A todos, muito obrigados:
Sem uma farta e grande mesa,
Sem amigos e convidados,
Páscoa seria… tristeza!

(...) Quinta de Candoz, 1/4/2013

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01 abril 2025

As nossas comidinhas: o sável com açorda de ovas







Alfragide > 23 de março de 2025 >  Um prato duriense, "sável frito com açorda de ovos" que vai bem com o "Nita", da Quinta de Candoz, colheita selecionada (2023)... A sugestão é da "Chef" Alice...

Foto (e legenda): © Luís Graça (2025).  


1. Caros leitores:  todos os dias a malta  tem de comer, mal ou bem...  Mas, parece, que cada vez pior, diz o povo...E ele há coisas que vão desaparecendo das nossas mesas: caça, peixe, marisco, vitela, queijo e requeijáo de Serpa... Quem é que lhe chega 

Com a pandemia de Covid-19, a malta habituou-se aos enlatados: atum com grão de bico, cavalas em óleo de girassol,  sardinha em óleo picante com pickles, etc. E aos congelados... Mas, feitas as contas ao quilo, até o raio das conservas de peixe estão pela hora da morte...

Até os petiscos dos pobres passaram para o cardápio dos ricos, do bacalhau ao polvo, do berbigão à sapateira, do sável à lampreia...

 Será que ainda se fazem as "iscas com elas" ?  E ainda há quem faça "tomates de carneiro" ?...O que desapareceu, do nosso tempo, foram também as tascas, com serradura no chão e pipos de tinto carrascão na parede, mesas de tampo de mármore e mochos de madeira em vez de cadeiras de plástico...

Mas estamos numa época boa para certos "petiscos" como as favas suadas, as "casulas com butelo" ou o sável frito com acorda de ovas... Foi o que a nossa "chef" Alice fez para celebrar os dois mesinhos da segunda neta, a Rosinha (em 23 de março)... Dizem os comensaios que foi comer e chorar por mais (o sável foi generoso, tinha dois quilos e meio e trazia as ovas...). 

Era um "prato" que se comia à mesa dos pobres, na Quaresma, por duas razões: 

(i)  era a altura do sável subir o rio Douro para desovar (ainda não havia barragens); 

(ii) os pobres não compravam a bu(r)la ao senhor abade, os "rendeiros" não podiam comer carne mas precisavam de proteína para trabalhar  as terras do seu "senhor e amo", o sável vendia-se de porta em porta, enfiadas num longo varapau,  tinha muitas espinhas, era preciso engenho, arte e paciência para o saber cortar fininho e fritá-lo em azeite...

Ele há coisas que não há no céu... E que  não preço. E que, por isso, náo passam pelo estreito dos bilionários... E uma delas é seguramente a açorda de ovas com sável frito, com um toque muito especial do alho e do coentro (que era do Sul, dos ganhões, e que por isso não ia à mesa do rei)... 

Tudo à moda da "Chef" Alice, segundo uma receita antiga da família da Quinta de Candoz, que ainda é do tempo do extinto concelho de Bem Viver e das pesqueiras do rio Douro que tinham foral do senhor Dom Manuel , o Venturoso.

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Nota do editor LG:

Publicado outra versão no blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné > 27 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26623: No céu não há disto: Comes & bebes: sugestões dos 'vagomestres' da Tabanca Grande (47): Um prato duriense, que se comia na Quaresma, "sável frito com açorda de ovas" (e que vai bem com o "Nita", da Quinta de Candoz, um DOC verde, branco, colheita selecionada, 2023, diz a "Chef" Alice)

24 março 2025

Nita, dois anos de saudade sofrida

 


Nita (1947-2023)... Candoz, 22 de setembro de 2022.
 Foto: LG (2022)

Querido Gusto, 
e meus queridos sobrinhos, Luís Filipe e José Tiago:

Faz-nos tanta falta a vossa Nita, a nossa Nita.
Sabemos, racionalmente,
 que já não está aqui, ao nosso lado.
Mas recusamo-nos a aceitar 
a sua separação definitiva.

Dois anos depois 
ela continua nos nossos corações,
Nas nossas casas, 
nas nossas fotos, 
nas nossas conversas.

E eu ainda sei de cor o seu antigo número de telemóvel.
Podem achar uma patetice da minha parte,
Mas às vezes ainda tenho a tentação de ligar-lhe.

Partilho convosco o que me passou pela cabeça,
esta amanhã, no 2º aniversário da sua morte,
e que pedi ao Luís que passasse a papel.

É também a minha, nossa, maneira de estar convosco
neste dia de saudade sofrida,
com vós que eram o “mais que tudo” da minha mana Nita.

Não, o tempo não cura tudo.
Vamos continuar a celebrar a sua memória,
à nossa maneira.
Até à Páscoa. 

Alice (e Luís)
_____________

Querida Nitas:

Hoje queria tanto ouvir a tua voz.
E poder prosseguir as nossas conversas
que a tua morte veio interromper.
Conversas às vezes de mais de uma hora,
conversas de irmãs, mais do que de mulheres,
que os nossos homens podiam achar
que eram conversas da treta.

Queria, tanto, do outro lado da linha,
poder ouvir as tuas gargalhadas,
as tuas interjeições,
e o teu suave calão do Porto
"Vai-te, Afonso!"...

Tenho às vezes a tentação de ligar 
para o teu antigo número de telemóvel, 914772956.
Recuso-me a eliminá-lo da minha lista de contactos.
Uma voz neutra de mulher, pré-gravada, responde-me:
"O número para o qual ligou,
não pode neste momento ser contactado.
Por favor tente mais tarde.
Obrigado".

... E ouço e ouço o raio do robô
na inútil esperança de ainda, por fim, por milagre, 
aparecer a tua voz
cujo timbre nunca esquecerei...

Pois é, Nitas, quem disse que o tempo tudo cura
não sabia o que era a imensa vontade de viver que tu tinhas
e nossa a imensa alegria de partilharmos
as pequenas e as grandes alegrias da vida,
enfim, cumplicidades de duas irmãs
que bem podiam ter sido gémeas...

Tenho, temos, tantas saudades tuas.
Saudades sofridas.
Já chorei por ti ontem à noite e hoje de manhã.

Tua Chita.

21 janeiro 2025

Ao João Graça, que hoje faz anos e não precisa que a gente lhe diga que o ama muito





Guiné-Bissau > Região de Tombali > Parque Nacional do Cantanhez > Iemberém > Dezembro de 2009 > O Dr. João Graça, médico e músico,  ofereceu cinco dias (de 6 a 10 de Dezembro de 2009) das suas férias de quinze dias (de 5 a 19 do corrente), para trabalhar como médico no Centro de Saúde Materno-Infantil de Iemberém. Para além de Bissau e do Cantanhez, esteve também nos Bijagós, na zona leste (Bambadinca, Tabató, Bafatá, Contuboel e Gabu) e na região do Cacheu (São Domingos)

Aceitou, no regresso,  integrar a nossa Tabanca Grande e a publicar alguns apontamentos e fotos do seu diário de viagem.

Espantosa, a primeira foto de cima, em que o menino de Iemberém, a aprender a gramática da vida,  como que nos interpela, a todos, não só os pais-fundadores e os homens grandes da Guiné-Bissau mas também todos nós, portugueses, europeus e cidadãos do mundo... "Que lugar há para mim neste mundo que devia ser meu e teu, o nosso mundo, o único lugar que temos para nascer, crescer, viver e morrer com saúde, em liberdade, com dignidade, em paz ?"

Fotos (e legenda): © João Graça (2009). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar; Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


A gramática da vida

Ao João, que  hoje faz anos

Contra o ponto (.) a vírgula (,)
Contra o ponto de exclamação (!) as reticências (…)
CONTRA OS TíTULOS DE CAIXA ALTA,
o ponto de interrogação (?).
Ou então abram alas, malta,
parênteses, curvos ( ) ou rectos [ ],
e parem só aos sinais de proibição.

... Por precaução.


E ao Não!, digam Não!, ponto de exclamação (!).
E aqui carreguem nos sinais de interjeição:
Ai! ei! ii! oi! ui!...

... Que, com a vida sem pica, a gente fica
sem palavras nem (lo)comoção!



Ao sinal verde, toca a arrancar e a marchar
contra os OOO da arrogância,
os UUU da flatulência,
os III da intolerância,
os EEE da estupidez,
os AAA da bravata e os RRR do arroto,
mais os ÇÇÇ do caraças da doença,
e, pior, os acen(t)os da demência.


Cuidado, ao final das escadas,
â direita,
o cano de esgoto,
não escorregar em contramão.

... Não há receita contra as gralhas e as calinadas,
e os atropelos à decência.



War is over, baby,
bela bajuda de mama firme,
tira fora o chapéu de abas largas
e atira flores aos que morreram,
em terra, no ar e no mar,
pelas causas que não têm deferimento.

... Não os deixes inumar
na vala comum do esquecimento!



Cuidado, camarada,músico do mundo,
trânsfuga, refractário, desertor,
prisioneiro, inimigo, comissário,
capelão, comandante, detrator,
miliciano, agente duplo, lavadeira,
escriturário, artilheiro, piloto,
grumete, xico, cadete, capitão,
crente ou ateu, tanto faz,
e olha o robô,
que, no fim da picada, podes ser cuspido, zás!,
pela força centrífuga do silvo da cobra cuspideira
que se mordeu a si própria.

... Mas, a sério, ninguém se magoou ?


Quanto ao macaréu, já não é o que era,
garantiram-te no Xime...
Deixaram assorear o Geba Estreito,
que crime!,
os administradores das águas fluviais
braços de mar, tarrafes e canais de irrigação
da liberdade criativa.

... Dizer que o trabalho é bom p'ró preto
já não é politicamente correcto. Corta.


Mas que importa,
se já nem vocês se afoitam, pessoal,
de peito feito, aberto,
contra os jagudis imperiais do Corubal
que comeram as últimas letras do alfabeto.

... Morreram todos, os cabras-machos!


Para que serve afinal a liberdade sem a poesia nem a "bianda" ?
Há que pôr os pontos nos ii,
no semáforo intermitente,
engraxar as botas,
brunir os colarinhos,
escovar o camuflado,
serrar fileiras e os dentes,
pensar na puta da vida,
e no povo, agora, murcho, calado e tolo,
e abrir aspas entre as falas em crioulo.

... Enquanto o corpo está quente e o sangue sai às golfadas.


Até o barqueiro, coitado, perdeu o k da kanoa,
varada no tarrafo do Mato Cao.
Sem o til.

... Levaram-no, ao pobre do til, para o canil de Lisboa.


Há agora um fantasma de um quarteleiro
à procura das estrias, frias, do morteiro...
Triste samurai, aquele, que não encontra o fio nu da espada,
E em vão procura o historiador o rumo da história.

... E, ai! do pobre (a)tirador,
aquele que se mata a (a)tirar
o acento circunflexo da bala na câmara.


Encontraste um 'djubi', numa escola do mato,
exercitando o seu estilo caligráfico,
em caderno de duas linhas,
de acordo com a norma do acordo pouco ortográfico.

... Oxalá, Insh'Allah, Enxalé!



Resta o humorista, o velhaco,
que é sempre o último a perder
os quatros humores,
já no fundo da pista onde acabam todas as peugadas:
sangue, pouco e fraco, diz o o doutor,
fleuma, de mal a piores,
bílis amarela, quanto baste,
e bílis negra, às carradas.

... Que o último a morrer,
nem sempre é o que morre melhor.


Que o que faz bem ao braço, faz mal ao baço
e já não há coração que aguente
a pressão hiperbárica do pulmão.
O fígado, esse, mesmo de aço e de inox,
é um passador crivado....

... De balas sem ética nem estética, diz o raio X.

Não sabes o que é que faz mais urticária,
ao tabanqueiro viril, que não arreda pé,
se a inveja do pobre em hidratos de carbono
ou a pesporrência do rico em sais minerais.
Resta a cruz de guerra
da guerra de mil e troca o passo, na Guiné,
e os seus heróis.

... Todos diferentes, todos iguais.

Quanto à vida, baby,
no fundo, é tudo tretas:
sangue, suor e lágrimas...
é quando se tem 20 anos,
força nas canetas,
e muito esperma para dar e vencer.
Agora já se não usam palavras com trema.

... Nem tu sabes o que fazer com este poema.


De qualquer modo,
quando a gente morrer,
que não seja por falta de imaginação,
ou de habit(u)ação,
ou de fim do prazo de validade,
que seja ao menos numa cama fofa,
de consoantes e vogais.
Sem travessão. E com piedade.

...E mais:
dispensemos a notícia nos jornais.


Luís Graça
© 2008 | Revisto em 21/1/2025

Publicado originalmente aqui, no Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné
 

15 janeiro 2025

Nita, faz hoje 78 anos que nascias na Quinta de Candoz...Obrigado pelo privilégio de te termos conhecido e amado

 



Querida Nita,

como é que poderíamos esquecer o dia em que tu "partiste", 

24 de março de 2023 ?

E hoje, o dia em que farias 78 anos,

e iríamos estar todos à mesa à tua volta,

celebrando o milagre da vida e da medicina ?

Ah!, lutaste brava e arduamente contra a doença e a morte,

e,  apesar de tanto sofriment0, 

como tu gostavas da vida e dos teus "mais-que-tudo"!...


Não te poderíamos esquecer,

mesmo que muitos nos digam que o tempo tudo apaga:

temos as nossas casas cobertas com as tuas fotos,

porque, mesmo depois de morta,

o teu sorriso doce será sempre uma terna e eterna 

recordação de ti,

e ajuda-nos a suportar um pouco melhor a tua perda...


Como nesta foto de 18 de setembro de 2020,

já estavas doente mas eras a mais feliz de todos nós,

nas vindimas, em Candoz...


Os teus filhos, Tiago e Felipe,

o teu homem, o teu Gustito,

toda a família, toda a Quinta de Candoz,

todos nós,

estamos espiritualmente ligados contigo,

não importa onde estejas,

no céu da tua fé

ou na galáxia mais distante da nossa infinita tristeza,

neste dia em que tu gostavas tanto 

de receber flores, poesia, beijinhos e chicorações,

para partilhar esta efeméride,

este momento efémero,

com muita saudade,

mas com também com muito orgullho

por tudo o que nos deste,

por tudo o que foste para nós,

pelo exemplo e pela inspiração 

que continuas a ser para nós!


Nascias há 78 anos, na Quinta de Candoz!...

Bebamos hoje do teu/nosso vinho "Nita",

ao privilégio de te termos conhecido,

e de termos partilhado contigo

as pequenas grandes coisas que, afinal, contam na vida,

e neste mundo,

o amor, a amizade, a beleza, a saúde, a paz, a liberdade.


Os teus mais-que-tudo... 

Quinta de Candoz, 15 de janeiro de 2025


23 dezembro 2024

Querida Nita, deixámos um lugar posto à mesa para ti, neste Natal de 2024

 



Madalena, Natal de 2024 | Luís Graça (2024)



Querida Nita:

Deixámos um lugar posto à mesa para ti

Neste nosso jantar de Natal de 2024.

Antecipado.

Estamos cá todos, só faltas tu.

Ou somos nós que te faltamos.

Já se passou um ano e nove meses

que nos separámos.

A dor ficou, a saudade vai crescendo com o tempo.

Mas não quisemos que o teu Gustito

e os teus filhos se sentissem sós.

Por isso viemos, eu, a tua mana Chita, 

o Luís e a Joana.

Para, juntos, nos sentirmo-nos mais fortes,

e celebrarmos a tua memória.

Estamos a fazer o teu Natalinho.

Ninguém te pode substituir.

Mas eu esforcei-me para fazer  tudo 

o que tu gostavas de fazer,

e o teu Gustito fez as honras à casa,

como ele e tu gostavam sempre de fazer...

Estamos a beber do teu vinho 

e a comer do teu pão...

Numa verdadeira comunhão natalícia.

Não faltou o bacalhau com todos, 

os bolinhos de cornflakes,

a aletria,

o arroz doce,

e as demais guloseimas da tua mesa de Natal.

A mesa está bonita e farta,

como nos bons teus/nossos velhos tempos,

mas faltas cá tu.

Sem ti, nunca mais será o mesmo Natal.

Sem a tua alegria contagiante,

sem o teu coração de ouro,

sem o teu doce socrriso,

sem os teus abraços para todos nós,

teus familiares e amigos,

Mas tentamos fazer o nosso melhor,

Está cá o teu Gustito

o teu Filipe, o teu Tiago,

os teus amores,

as tuas queridas Susana e Sofia,

os teus netos, Carolina e Joquinhas!

(Como ela e ele cresceram, 

não os irias reconhecer!)

Reza por nós, 

para que o ano que agora vai começar,

seja mesmo novo,

e haja saúde, paz e alegria na nossa terra,

na casa de todos nós.


Tua mana Chita.

24 março 2024

24 de março de 2024: Homenagem à nossa Nita (1947-2023) (Chita)


Peniche,  Cabo Carvoeiro,com as Berlengasd ao fundo: a Nita e a Chita, 6 de agosto de 2021. 

Foto: Luís Graça (2024)


24 de março de 2024: Homenagem à

nossa Nita (1947-2023) 

pela Chita



Há um ano que partiste…para a viagem mais solitária, que todos temos de fazer um dia, mais cedo ou mais tarde, a da despedida da Terra da
Alegria…

Tu partiste, maninha… E deixaste cá tudo, o que não precisavas, para essa tua última viagem, incluindo a Quinta de Candoz…

Tu partiste, mas deixaste-nos o espírito de Candoz, que tu sempre viveste e representaste como ninguém, ao longo de quase quatro décadas… Esse espírito continua vivo e a inspirar-nos.

Tu partiste, Nita, mas podes continuar a ter orgulho no teu Gusto, nos teus filhos e noras, nos teus sobrinhos, em todos nós que aqui estamos: enquanto secamos as nossas lágrimas, e suspiramos por ti, prometemos também nunca te esquecer, e manter vivo o teu testemunho, o teu exemplo de vida, o teu amor a este cantinho que é
Candoz.

Tu partiste, mas sempre personificaste o dom, a doçura, o prazer e a alegria de dar e receber.

Tu partiste, minha querida mana, mas todos nós tentámos dar a volta à nossa dor, elegendo-te como a nossa deusa tutelar, protetora e inspiradora.

Tu partiste, mas continuamos a fazer, juntos, coisas lindas como este vinho na tua/nossa Quinta de Candoz…

Foi um sonho lindo, sobretudo do teu filho Tiago. Ele quis, e nós todos quisemos, fixar uma parte de ti, o melhor de ti, a tua “alma”, no rótulo e no conteúdo das garrafas deste nosso vinho, colheita especial de 2023, o ano em que partiste!

Na Quinta de Candoz, tu foste, comigo (e claro o teu homem), a mais entusiástica do projeto de modernização da cultura da vinha, há 40 anos.

Agora, com outras condições tecnológicas e com o apoio de enólogo, temos a primeira colheita e a primeira garrafa com o teu nome, o teu “petit-nom”, Nita.

Para além dos sabores e cheiros que o enólogo tão bem identificou, nós acrescentamos: tem também uma lágrima tua, uma pitada da tua alegria de viver, da tua felicidade na terra, muita da tua essência, do
teu perfume, da tua generosidade, das tuas memórias e referências, que são também as nossas…

Fazer este vinho (e agora prová-lo em neste dia tão especial) deu-nos vida e, acima de tudo, reforçou a nossa vontade de continuar a cuidar do teu legado..

Nita, tu partiste apenas, não “morreste” (nos nossos corações)…

Deixo aqui também um álbum com os versinhos e as orações que te dedicámos, eu e a minha família, e também uma seleção de fotos dos nossos melhores momentos.

Vou também agora brindar, com muita emoção, à tua memória, mas também à nossa vida, aos teus amores e aos teus amigos, incluindo os do ISEP, dos coros e do cavaquinho, que quiseram estar aqui
contigo e connosco.

Um brinde também aos nossos descendentes, filhos e  sobrinhos, que admiravelmente estão a manter vivo e a reinventar o espírito de Candoz.

Lá no alto, lá na tua “estrelinha”, querida Nita, continua a proteger-nos, a velar por nós e a inspirar-nos!

Até sempre, minha querida mana e amiga!

Tua Chita, Quinta de Candoz, 24 de março de 2024.



Nita, Quinta de Candoz, Vinho Branco verde, seleção 2023, 13º 
 Foto: Chita (2024)

24 de março de 2024: Hoje, só me apetece gritar: ainda era cedo, Madrinha, Tia Anita! (Cristina Barbosa)





Lagos, 1981 > Junto à estátua do rei Dom Sebastião de José Cutileiro (1973): da esquerda para a direita, Gusto, Filipe, Cristina, Nita, Joana, Chita, Béu… (Ainda estavam para nascer o João e o Tiago)

 Foto: Luís Graça (2024)


Ainda era cedo, Madrinha, Tia Anita!


por Cristina Barbosa


Há um ano atrás, o dia amanheceu. e logo de imediato, ficou nublado e muito triste!

Em casa de cada um dos teus amores, se suspirava por ti... Não quero falar muito sobre esse dia.

Desde que me conheço gente, nomeie-te de minha segunda mãe, e tu correspondeste a este valor que te atribuí.

Pois foi, ensinaste, ouviste, reprendeste, preocupaste, ajudas-te, sofreste, sorriste, abraçaste (me), o inerente a cada um destes verbos, juntando o nós em cada momento que eu precisei.

Estavas SEMPRE lá!!

Gostei tanto de te ter presente na minha vida, que estendi-te a ti e ao tio Gusto, o convite de padrinhos do meu filho mais velho, o Nuno, ao que prontamente acederam e, por quem nutrem carinho igual ao que têm por mim.

Tenho a cada dia 24, feito uma espécie de “Diário de Bordo”, sobre o que vivi contigo e com os eus... Faz-me bem!... Hoje, vou partilhar algumas de tantas coisas que vivenciamos. Guardarei sempre o nosso último encontro, foi maravilhoso e vou guardar o teu último beijo e o teu último sorriso às sete chaves para que não mo possam tirar.

Agora Candoz...

A primeira vez que lá cheguei após a tua partida, faltavas tu para me receber com o teu bonito orriso acolhedor, a alegria do teu olhar luminoso igualável À tua presença empática, simples, mas enorme como os teus abraços. Bem tentei previamente preparar-me para o momento. Mas a cada janela que abria, vinha a vontade de me assomar a ela e gritar... Tudo me falava (fala) de ti. As flores, a vinha, os tachos, o linho, os odores, o pó...

Após este ano, nada disso mudou. Mudou a nossa dinâmica em família de continuar viva Candoz, em homenagear-te em tudo o que fazemos, colocando um amor igual ao teu.

Hoje, senti a tua falta! No primeiro Domingo de Ramos sem a tua presença física, naquele almoço que gostava de preparar para vós com todo o carinho. Agora recebo um bocadinho de ti através do Tio e dos meus primos. Vou pedir ao Kiko que gosta de Candoz para passar o texto a computador, porque no rascunho são visíveis as marcas das lágrimas que me caem no rosto.

Hoje, só me apetece gritar: Ainda era cedo, Madrinha, Tia Anita!

Cristina Barbosa

A tua afilhada, ANA Cristina 24/03/24

23 março 2024

Quinta de Candoz: a sagração da primavera e o lançamento do nosso vinho, Nita, edição especial 2023

 












Marco de Canaveses > Paredes de Viadores > Candoz> Quinta de Candoz > 21/22 de março de 2024  > "Aguarelas" da primavera ... No fundo do vale passa a linha do Douro (que liga Ermesinde ao Pocinho, numa extensão de 160 km)... Do outro lado é já concelho de Baião. E,  do lado direito, não vívísel nas fotos, o rio Douro, a barragem do Carrapatelo, o Porto Antigo, a serra de Montemuro, Cinfães...


Fotos (e legenda): © Luís Graça (2024). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné] (Todas as imagens, exceto a primeira de cima, e as duas últimas, são  HDR - High Dynamic Range, tiradas sem tripé)



 1. A Quinta de Candoz, já nas faldas da serra de Montedeiras, ainda hoje assombrada pelo fantasma do Zé do Telhado (1816-1875) e do seu bando, tem múltiplos encantos ao longo do ano... Neste caso, na Primavera, que começou a 20 de março e vai até 20 de junho... 

Já temos poucas "cerdeiras" (cerejeiras) (o forte da cereja é o concelho aqui ao lado, Resende, já na margem esquerda do rio Douro, distrito de Viseu)... No passado, a Quinta de Candoz mandava muitos cestos de cerejas para o Porto, através do comboio da linha do Douro (que tem aqui, perto de nós, a estação do Juncal, outrora animada e florescente)... 

Por altura da Páscoa, as "cerdeiras"  são sempre deslumbrantes, quando estão floridas...  As "cerdeiras" e outras árvores de fruto... Mas também os carvalhos, que começam a ganhar folhagem... E as videiras, com os seus primeiros rebentos... 

E encantatória, mágica,  é sempre a água que vem, aos borbotões,  das nossas minas, ainda pura e fresca... Que pena não a podermos reter toda aqui... Vai ter à albufeira do Carrapatelo e, por fim, ao mar...

Aqui fica uma pouca amostra da "sagração da primavera" em Candoz, com votos de Boa Páscoa para todos os nossos leitores.  

Para nós, este vai ser um fim de semana muito especial, em que recordamos a "partida" da nossa querida Nita, Ana Carneiro (1947-2023) e, em sua homenagem, vamos lançar um vinho verde branco, com o seu "petit-nom"no rótulo, "Nita", uma edição especial, seleção 2023, 13º graus. Pela primeira vez  reunimos as condições tecnológicas e o apoio de enólogo para fazer um vinho que nos orgulha, que tem cheiros e sabores a "chá verde, espargos e flor de magnólia"... E que tem muita da alma, do perfume, da essência da nossa Nita, das suas memórias, vivências e referèncias.  Foi ela  que nos inspirou e reforçou a nossa vontade de manter vivo  o espírito de Candoz.