10 abril 2023

Manuscrito(s) (Luís Graça): Circadiana, a vida

 



















Quinta de Candoz > 9 de Abril de 2023 > Páscoa: a vida que sucede à morte.


Fotos (e texto): © Luís Graça (2023). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




 

Circadiana, a vida

por Luís Graça


Circadiana,  a vida!...
Depois do solstício do inverno, virá o solstício do verão
e aos dias suceder-se-ão as semanas, os meses, os anos.

Circadiana, a vida!...
Pior que o suplício do inferno
é o pavor do eterno retorno.
É a eternidade, dizem-te,
que nos move ou demove ou comove, 
a eternidade ou a sua cruel ilusão,
os seus sucedâneos terrenos, efémeros, 
a fama, a honra, a glória,
 a vaidade, o ouro, os diamantes,
o elixir da juventude, a beleza,
o amor até que a morte nos separe,
o poder, orgástico, de mandar matar e morrer
talvez a paternidade e o egoísmo genético.

Circadiana,  a vida!...
Afinal todos os anos é Natal
e todos os anos por aqui  passa(va) o compasso pascal.
Aleluia, aleluia, Cristo ressuscitou,
a vida triunfa sobre a morte.

Circadiana,  a vida!...
Todos os anos, com sorte…
Exceto quando deixaste a tua terra e foste para a guerra:
perdeste a noção do dia e da noite,
dos dias, das semanas, dos meses, e das estações,
que eram duas, a do tempo seco e a das chuvas.

Circadiana, a vida!...
Disseram-te que o velho general
esteve à beira da tua cama no hospital:
- É uma subida honra, para qualquer mortal,
a sua visita, meu general ! –
terás tu dito mas, por favor, e por pudor, não ponhas isso
no teu “curriculum vitae”.
Esquece a Guiné, camarada, meu herói,
e os pauzinhos que gravaste na parede da caserna,
na contagem decrescente para o fim da tua (co)missão.

Circadiana,  a vida!...
Quando eras jovem, tinhas um calendário perpétuo, 
na tua mesinha de cabeceira,
na secreta esperança de que os dias não tivessem 24 horas,
não tivessem noite, não tivessem fim.
Depois, deixaste de te fiar nas leis imutáveis da natureza
e, todos as manhãs, tomavas o lugar de Sísifo
e pegavas na tua pedra de granito,
montanha acima, montanha abaixo!

Circadiana, a vida!...
E, se Deus quiser, a primavera há de chegar, 
e c0m ela as cerejeiras em flor,
e os melros que vão pôr os seus ovos 
nos arbustos de alecrim no caminho para a leira cimeira,
e as andorinhas que irão reconstruir o seu ninho 
na varanda da casa de cima.

E trazem histórias de coragem,
as tuas andorinhas de torna-viagem,
vêm do norte de África, quiçá da Guiné,
e não precisam de passaporte,
nem de GPS, nem de código postal, nem de carimbo das alfândegas.
São heroínas, sobreviveram a mais um ano,
fogem da guerra, e das alterações climáticas,
sem o aval nem a ajuda do alto comissário para os refugiados,
ou a benção dos imãs 
e dos demais representantes de Deus na terra.

Circadiana,  a vida!...
E todos os anos fazes anos
e haverá sempre um bolo de aniversário
e uma vela para soprares.
E oxalá nunca te falte à mesa
quem te cante os parabéns a você.
Mas o que é que tu sopras, afinal,
meu pobre feliz aniversariante ?
Sopras a vida, sopras a vela da vida, de fio a pavio!

Circadiana,  a vida!...
Até as almas têm estados, dizem-te, circadianos,
estados de alma, bipolares,
ora de euforia ora de depressão,
socalco acima, socalco abaixo...
Afinal, tão certo como dois e dois serem quatro,
à noite sucede o dia, 
e não há lua sem sol, nem maré alta sem maré baixa!

... Nem a morte sem  a vida.
Mas chorarás sempre  os teus mortos, 
até que as tuas lágrimas te sequem.

Circadiana, a vida, meu amor!...
A vida é pura repetição,
é o teu coração que bate forte, até à exaustão,
até a gente queimar a vela, de fio a pavio.

Circadiana a vida!
Carpe diem, meu amigo:
ora sabe a muito, ora sabe a pouco,
... a vida, sempre, armadilhada,
presa por um fio de tropeçar.

Última versão, Candoz, 9 de abril de 2023

Disponível também no blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné
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03 abril 2023

Na hora da despedida da Terra da Alegria: homenagem à nossa querida Nitas, Ana Ferreira Carneiro Pinto Soares (Candoz, 15 jan 1947 - Porto, 24 mar 2023) - Parte VI (O Jardim da Madalena)










Madalena, Vila Nova se Gaia.. O Jardim da Nitas... 3/4/2023

Fotos: LG (2023)

Na hora da despedida da Terra da Alegria: homenagem à nossa querida Nitas, Ana Ferreira Carneiro Pinto Soares (Candoz, 15 jan 1947 - Porto, 24 mar 2023) - Parte V (Gratidão ao CHUSJ - Centro Hospitalar Universitário de São João)

 À administração e à direção clínica do

Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ)

Data – 30 de março de 2023

Assunto - Agradecimento

A família de Ana Ferreira Carneiro Pinto Soares (1947-2023), proc. nº 19006217, na pessoa do seu marido, filhos, noras e netos, faz questão de vir agradecer, por este meio, os quatro anos de cuidados de saúde que lhe foram prestados, ao longo do processo de tratamento da sua doença, que teve agora o seu desfecho trágico, em 24 de março último.

Queremos a agradecer a todos os profissionais da UAG de Medicina, quer do Hospital de Dia  quer do Serviço de Hematologia Clínica e ainda do Serviço dos Cuidados Paliativos, médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, técnicos auxiliares de ação médica, técnicos administrativos e outros, onde  a nossa Ana beneficiou de elevados padrões de qualidade assistencial, não só ao nível técnico como no plano do conforto e dignidade como pessoa.

Foi utente do Hospital de Dia desde março de 2019: todas as semanas e por vezes mais do que duas vezes por semana, a nossa Ana recebeu transfusões de sangue (hemoglobina e plaquetas), e fez também quimioterapia.

Esteve igualmente internada, na parte final da sua doença, no Serviço de Hematologia Clínica, em dois períodos: de 2 a 10 de janeiro último, e depois, desde 8 de fevereiro até à data da sua morte, em 24 de março. Recebeu ainda cuidados paliativos na fase terminal, continuando no entanto internada no Serviço de Hematologia Clínica.

A todos os profissionais de saúde que direta ou indiretamente lidaram com a Ana e a ajudaram a manter-se viva e com a qualidade de vida que foi possível, estamos muito reconhecidos e gratos. Sem a sua competência, dedicação e empatia, a Ana teria sofrido muito mais, ela e toda a família mais próxima. Particular destaque tem de ser dado ao hematologista dr. Ricardo Pinto a quem ela chamava o seu “anjo da guarda”. Sabemos que, sem o seu saber, carinho e entrega (quiçá com prejuízo até da sua vida pessoal e familiar), a Ana já teria partido há muito.

Bem hajam, todos/as.

Boa saúde, bom trabalho. Queiram receber as minhas melhores saudações

Augusto Teixeira Pinto Soares, Porto