16 abril 2012

Luis Henriques (1920-2012), "meu pai, meu velho, meu camarada" (Parte I)


Luís Henriques, mais conhecido por Luís Sapateiro, nasceu na Lourinhã, distrito de Lisboa, em 19 de agosto de 1920, na atual rua da Misericórdia, num prédio hoje em ruínas. Homem de fé, morreu numa manhã soalheira de domingo de Páscoa, no passado dia 8 de abril, na Atalaia, no Lar e Centro de Dia de N. Sra da Guia, onde vivia com a esposa, Maria da Graça, desde meados de 2008. 


Morreu em paz, consigo, com os seus descendentes (4 filhos, 12 netos, 5 bisnetos), com Deus e com o mundo.

Tinha raízes, pelo lado do pai, Domingos Henriques, no Montoito, e pelo lado da avó materna, Maria Augusta de Sousa, em Ribamar. O meu avô paterno, que ainda conheci na infância, terá morrido com 91 anos. Usava muletas e fumava a sua beata: é a imagem que eu tenho dele. Dizia o meu pai que ele tinha ficado mal das pernas por causa do mar: como muitos agricultores das zonas ribeirinhas (Montoito, Atalaia, Areia Branca...), era nos tempos livres um mariscador, dedicando-se à apanha tradicional de polvos e crustáceos. Foi homem de teres e haveres, tendo casado três vezes. Do primeiro casamento, não teve filhos; do segundo, teve o meu pai e o meu tio (e padrinho de batismo), Domingos Severino, já falecido. Do terceiro casamento, teve "uma equipa de futebol e um suplente", como dizia, com graça, o meu pai.


Sua mãe, Alvarina de Jesus [, foto à esquerda], filha de Francisco Sousa, da Lourinhã, e de Maria Augusta, de Ribamar, morreu jovem, em 1922, de tuberculose, fato que o marcou para toda a vida: a mãe nunca lhe pôde dar um beijo!... E nos seus três últimos dias de existência, em que eu tive o privilégio de o acompanhar no seu leito de morte, evocou o nome da mãe Alvarina por mais de um vez. 

A minha avó paterna, Maria Augusta, nasceu em 1864, em Ribamar. Era uma Maçarica, que veio casar na Lourinhã, com um peixeiro.

Luis Henriques, órfão aos dois anos, viveu nos primeiros anos de infância com a nova família do pai, que casou pela terceira vez. Ao todo teve uma dúzia de irmãos. Fez a instrução primária (na época quatro anos de escolaridade) na velha Escola Conde de Ferreira (demolida pelo camartelo camarário antes do 25 de abril), sob a direção do saudoso Prof José António, que ainda conheci na minha infância, pai do nosso conterrâneo Jorge Pedro.

O meu primeiro emprego foi como… “máquina registadora e de calcular”, nas duas lojas do fotógrafo e comerciante Manuel Lourenço da Luz, que veio da Praia da Vieira para a Lourinhã, na primeira ou segunda década do séc. XX, e que foi pai do fotógrafo António José da Luz (Foto Luz). 

 A loja, na Rua Miguel Bombarda, vendia uma miscelânea de artigos fotográficos, vidraria, molduras, papelaria e bijuteria  [Vd. foto à direita, cortesia da bisneta do Manuel Lourenço da  Luz, a Ana Luz Pignatelli].

O Luís era muito rápido e fiável a fazer contas. Terá trabalhado para o seu primeiro patrão, na Lourinhã e na Praia da Areia Branca, a troco apenas da alimentação e de algumas gorjetas, durante cerca de 4 anos. 

O meu pai tinha recordações muito nítidas da época balnear, na loja da praia. Além da fotografia, o negócio do Manuel da Luz incluía o comércio de equipamento para caça e pesca. À segunda feira, ia com o patrão para a caça de patos, perdizes e coelhos ao longo do rio Grande…

Aos 13 anos, o meu pai terá uma nova família de acolhimento, a do seu tio materno, Francisco de Sousa (Fofa), músico e industrial de sapataria. Aprende o ofício de sapateiro. É criado com os seus primos António Francisco Sousa, Carlos Sousa e Milu (esta felizmente ainda viva; e todos eles com excelentes dotes musicais: o António tocava saxofone e fundou a primeira "banda de jazz" da terra, o conjunto Sol Do Ré Mi; o Carlos era um especialista em prata na banda da Lourinhã; e a Milú uma bela menina de coro; e o António Sousa era pai da Teresinha, a minha querida prima Teresinha, hospedeira de bordo em Angola, morta num um acidente aéreo, cujo ano não consigo precisar).

(Continua)

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